segunda-feira, 12 de setembro de 2016


Eu amei o texto que o Gregório Duviver fez para Clarice Falcão. Talvez por cansaço, talvez por identificação. E a despeito de todas as críticas que se possa fazer (e cabem muitas), o texto é lindo de ler. Faz a gente chorar. Faz a gente pensar que a Clarice tem sorte.
 
Considero sorte sim porque a maioria das mulheres não recebem declarações de amor públicas, nem cotidianas. Parece um insólito imerso. Nos amam pelo que somos e pelo que temos a oferecer. Mas acham que é um grande esforço nos colocar à mesa e assumir que somos as suas companheiras. Somos aquelas que têm lugar na doença, na solidão, nos trabalhos acadêmicos, nos abraços de óbitos familiares, nos casamentos longos e exaustivos. Quem seguramos a mão no cinema em tédio, a quem lhe rogamos a preocupação de chegar bem em casa. Mas não temos lugar entre os amigos, não temos lugar nas fotografias, nas histórias, nas viagens a negócios que envolvem o sucesso profissional, afinal, a mulher não pode participar em presença daquilo que os torna grandes. A mulher não poder ser maior e nem melhor do que o homem, nunca!

Meus últimos relacionamentos eu senti falta daquelas coisas pequenas do dia a dia que faz a gente se sentir amada. Que faz a gente perceber que nem tudo se trata de um mercado afetivo que ganha quem tem mais privilégios. Parece que a atualização do aplicativo afetivo mundano se desfez. No lugar disso estamos adoecendo numa disputa pelas migalhas da atenção masculina. E no final ninguém ganha. Perdemos e quase sempre nos sentimos um lixo. 

Cansadas e loucas. "Por que estou desconfiada disso? Ele nunca faria isso comigo". 
Mas eles sempre fazem. Tomamos ansiolíticos para aguentar os relacionamentos marcados pelo abuso. Pedimos pelo amor de deus para eles não fazerem de novo. Perdoamos. E perdoamos de novo. Tentamos entender porque o amor não pode ser correspondido da mesma forma. Homens não percebem que nos colocar à mesa e nos assumir vai além de mera ratificação social, mas de nos fazer sentir especiais, aceitas e amadas. Respeitadas não apenas em situação de emergência. Procuradas não apenas na solidão. Eu achei o texto lindo porque a minha trajetória afetiva é marcada pelo descaso e pela ausência. Acredito que a minha experiência seja coletiva. 
O texto é lindo porque por um minuto faz a gente crer em um mundo em que os homens possam amar as mulheres, e amar não à maneira egoísta de reter este amor e esta admiração para quando for conveniente. Amar nos elogios, apagar a vergonha de expor a mulher incrível que está ao lado deles, apagar a covardia de não querer que as pessoas vejam que, por trás de tantas brigas, existe uma história. Do lado de um bom homem, caminha uma grande mulher.



Valesca Rennó é professora e pesquisadora da Universidade Federal de Minas Gerais